03/05/2011

~~Vida e sonho

E tudo começou da seguinte forma...

Era uma dinâmica. Lembro bem de ouvir as palavras: “Cuidem do balão como se fosse a sua própria vida, e apenas caminhem pela sala”.
Fiz o que me foi mandado, agarrei o balão. O coloquei entre meus seios, como um coração pulsante, cheio de amor e mágoa, mas ainda assim tão meu que ninguém mais poderia tocá-lo de maneira tão íntima.
Até que das minhas mãos não sobrou mais nada.
Estouraram meu balão, e por completa irônia do destino senti meu coração sendo arrancado de dentro do meu peito. Ardeu. Ardeu incessantemente. Queimou dentro de mim o vazio que se instaurou.
A vontade de chorar era tão grande que eu nem sabia se deveria me lamentar ou tentar destruir o balão na mão dos outros.
Lembrava-me apenas de ter ouvido “cuidem...” e não “destruam”.
Caminhei até o outro extremo da sala, sentei e observei as outras pessoas tentando correr para lugares onde provavelmente não seriam alcançados. A maioria deles sem sucesso.

Seguiram dinâmicas diferenciadas...

O tempo passou e para dá tudo por encerrado houve um momento extremamente parecido com o primeiro.
Dessa vez, enchia-se balões e dento dele colocava-se um papel. Nessa pequena folha deveria está escrito o seu sonho, e escrevi o meu como quem escreve com o próprio sangue. Usei o sangue da minha vida (primeiro balão) que ainda manchava as minhas mãos, me incriminando de não ter cuidado dela de forma apropriada.
Escrevi com receio de que alguém pudesse ler e zombar das humildes palavras que tentavam se ajustar ao momento num espaço tão pequeno. Fiz letra miúda, como sou nesses dias frios, tão recolhida dentro de mim.
Dobrei o papel inúmeras vezes e ainda o enrolei ao fim para que o meu sonho não fosse exposto. Coloquei dentro do balão e nem sequer o enchi muito com medo de que ele estourasse e perdesse meu tão singelo sonho.
Pediram que ficássemos no meio da sala. Ficamos.
Pensei comigo “Dessa vez será diferente, visto que todos tomaram a primeira atividade como exemplo...”

Balela.

Mal concluí meu pensamento e pude ver pedaços da bexiga azul, enchida com tanto cuidado se espalharem pelo ar. E o pior veio logo a seguir. O meu sonho, aquele que guardei e escrevi tão vagarosamente com medo de realmente revelá-lo, estava caido no chão. Numa tentativa inútil tentei apanhá-lo, mas os pés que se moviam ao meu redor eram demasiadamente apressados.
Retirei-me.
Do meu lugar (O canto da covardia que havia me guardado desde o primeiro exercício) observei meu sonho e tantos outros que se juntavam a ele serem  pisoteados por inúmeros pés. As risadas eram altas, acompanhadas de gritos estridentes do tipo “sai!” ou “você estourou o meu, agora vou estourar o seu”.
A dor da primeira perda ainda era tão cortante que a segunda foi apenas um complemento. Senti-me como a muito não sentia. Cheia de nada.
Vi a minha vida passando por mim, e eu abrindo mão dela.
Frustrante!
Minutos depois todos sentaram-se, alguém pronunciou palavras sem sentido algum (pois não conseguia entender ou assimilar o que ouvia) quando de repente desperto do meu “coma induzido” pelas seguintes palavras: “Entender o que causa essa busca infinita por mim” ... Seguido de um “Profundo! De quem é esse?
Levantei a mão como se precisasse disso para viver, meu último suspiro estava naquele pedaço de papel. Meu sonho havia sido revelado!
Ruborizada tomei o papel das mãos que o conduziam e apertei em minhas mãos como se para absorver o desejo de tal modo que ele se tornasse o meu eu e eu me tornasse ele.
Ouvi alguns comentários a respeito mas não houve diálogo algum. Não permiti. Não me permiti. Tudo aquilo era muito meu; me sentia nua, completamente exposta e sangrando por um peito aberto onde não havia absolutamente nada.
Ninguém observou, mas queria sair correndo dali, pra nunca mais voltar.
Chovia. Confesso que não sei se mais dentro de mim ou fora. 
No primeiro momento que pude vim pra casa apressei-me. Usei grandes passos a fim de jogar-me na minha cama e não acordar antes que o dia se findasse. Assim o fiz.

De tudo isso tiro uma lição:
Doer... Dói! Mas ninguém se importa. O que realmente importa é que doendo ou não nos dias seguintes você deve sempre está de cabeça erguida para seguir a diante.
Entender? Não entendo. Não mesmo.

De conclusão, tudo que sei é que ainda sangro e que embora tenha nascido pra ser cor, hoje sou completamente cinza.


Cheiro do dia: Musgo e palavras abafadas.

2 Comentários:

Rerlyn disse...

Já participei dessa dinâmica e senti praticamente o mesmo Keilla, assim como percebi que ao fazê-la para meus alunos, muitos sentiram-se roubados frente a situação vivenciada(por mais explicação mecânica que possa haver). No fim das contas, é uma oportunidade de nos expor para nós mesmos, mesmo que relutantemente exposto aos outros....Acaba sendo válido, por vez.
Foi belo seu texto, foi bela sua coerência, sua delicadeza; mas nada foi mais encantador do que seus sentimentos postos ali em um Blog que mal cabe o respirar! Em um espaço tão infinitamente diminuto para o que se sente de fato. Você foi corajosa por expor o seu melhor, seu recolhimento, seu nada, seu tudo.O desabafo se cumpre nos detalhes e você o fez!...
Quero abraçar-te a cada texto sincero que faz, cheio de sangue e temperatura gélida ou quente o suficiente para queimar. Quero cuidar, quero conversar...Quero até mesmo me oferecer para,nesse caso, ficar de olho no seu sonho para que ninguém o veja!
....
Parabéns por Ser, minha amiga.Pela "Mulher Selvagem"[baseado no livro Mulheres que Correm com Lobos de Clarissa Pinkola Estés] que nunca há de sair de sua alma.

gabi disse...

Também participei dessa dinÂmica no meu primeiro ano na UPE. O meu balão ficou intacto. não lembro bem como consegui manter o meu bonitinho, achei que fiquei com ele escondido nas minhas costas, hihi....

Mas veja bem,florzinha, ser cinza um dia na vida faz bem. Cores fortes demais desbotam mais facil.

E que voltes a ser a cor de quiseres amanhã(:

p.s.: vou roubar esse gif, hihi

 
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