Domingo.
Quando cheguei a te ver enxerguei
uma criança sentada na ponta da cama. Com seus olhos penosos como se pedisse
algo, me olhou de baixo pra cima e sustentou seu olhar no meu. Eu sei que você
disse que me amava com aquele olhar, porque eu retribuí com meu olhar mais
verdadeiro e singelo. Tentei te responder o quanto te amava/amo e eu sei que
você entendeu a mensagem. Entendi isso logo depois, quando você abaixou o rosto
e mostrou um sorriso tímido num dos cantos do lábio.
Os cabelinhos tão brancos que
pareciam de algodão. Nunca tinha te visto tão pequeno, ou tão frágil. Banho
tomado, roupinha limpa, cabelo penteado... Fui almoçar e quando fui embora te
olhei da porta. Você fez questão de se virar na cama e disse “Tchau Keilla”...
Você nunca me dava tchau! Acho que você sabia!
Fui embora segurando o choro...
Não sei o motivo, mas queria ter ficado com você, não queria ter ido embora
depois de te ver tão pequeno...
Segunda.
Soube que você seria levado até
Recife para fazer uns exames... Mas você sempre foi tão forte que um exame
seria fichinha. E eu nem estava preocupada, pois sabia que em Recife você teria
MUITO MAIS do que precisava!
Terça.
Soube logo cedo que você tinha
tido um problema no estômago, mas que tinha sido medicado e que estava bem...
Mas a noite voinha me ligou e me disse que você estava mal, tinha piorado,
estava delirando e tinha dito a seguinte frase: “Quando é que Keilla vem me
ver?”. Chorei!
Quarta.
Você teve uma parada
respiratória, foi pro CTI, mas não foi o suficiente, precisava ir pra outro
hospital, pois precisava ficar na UTI para melhorar e ter toda a assistência
necessária. Procurei uma forma de ir te visitar, mas não arrumei um carro!!!!!
E agora?
Quinta.
Nem dormi a noite pensando como
seria te ver no dia seguinte. Tia tinha vindo me buscar para te fazer uma
visita! Estava tão ansiosa! Tinha certeza de que você ficaria muito feliz a me
ver já que tinha perguntado quando eu te faria uma visita! Eu estava eufórica!
Chegamos cedo demais em Recife,
os minutos pareceram horas! Quando finalmente chegou o momento de te ver!
Fiz tudo certinho como me
mandaram. Segui pelo corredor e entrei à direita. Lavei as mãos, os braços,
passei álcool em gel, caminhei muito devagar até o quarto com medo de que você
estivesse mal, eu queria te ver bem!
Entrei no quarto, e a única coisa
que registrei na minha mente foi o teu rosto! Cheio de aparelhos controlando
sua respiração. Senti-me sufocar junto! Corri ao seu encontro e segurei sua
mão. Os dedos inchados, todo machucado de furar pra tirar sangue e fazer exame,
verificar taxas... Mas eu lembrei que antes de entrar na sala me disseram: “ele
está dormindo, mas pode falar com ele que ele escuta tudo o que dizem!”. Fiz
carinho no seu cabelo, e soluçando falei: “Vovô, por favor, fica bem! Sexta que
vem é meu aniversário! Tudo o que eu quero é o senhor lá! Vai ser o meu
presente... A gente tá com saudade!!! Fica bom logo pra voltar pra casa! Eu te
amo tantoooo...” Uma máquina ao seu lado disparou, me assustei, olhei pros lados,
mas não lembro de nada da sala! Depois eu soube que seus batimentos cardíacos
tinham subido demais... Você queria me responder! Não consegui falar mais nada,
saí em prantos do quarto.
Sexta.
Seus rins pararam de funcionar!
COMO ASSIM? Mas o senhor é muito forte! Vai fazer uma seção só de hemodiálise,
o senhor vai ver! Eles vão voltar a funcionar e tudo vai dá certo!
Sábado.
11:20 pm. Meu celular toca:
“_Vida?
_Oi voinha! O que aconteceu?
_Oh vida... Vovô... Vovô foi
embora!“.
Domingo.
Cheguei à funerária e ninguém
tinha chegado ainda! Depois de muita relutância finalmente criei coragem para
te ver... Você parecia dormir! Segurei sua mão e disse: “Oh vovô, faz isso não!
Respira!” e você me mostrou que estava em paz. Deu um vento tão forte dentro da
sala que os véus saíram voando e as velas se apagaram... Eu sei que foi você me
consolando, foi você me dizendo que estava bem!
Nunca imaginei que um dia podia
ser tão longo! Nem que um único dia pudesse trazer tanta dor!
Segunda.
Meu coração foi arrancado do meu
peito e foi enterrado...
A semana se arrastou...
Finalmente, sexta-feira, o dia
que eu te pedi pra está comigo. Acordei triste, não queria ver ninguém, não
queria ir pra aula. Dormi novamente. Sonhei contigo! Você chegava muito feliz,
de terno e me pedia uma gravata. Mandou-me ficar bonita e parar de chorar...
Você disse: “Não quero ninguém triste hoje não! Hoje é dia de festa! Quero que
você fique bem bonita, e me coloque uma gravata, quero ficar bonito também!
Vamos pra missa e depois a gente vai comemorar seu aniversário!”
Por incrível que pareça eu
acordei melhor, eu sei que você passou a sexta ao meu lado, não fisicamente,
mas passou!
Perdoa-me por não ter te dito
mais vezes o quanto te amo!
Estou com saudades vovô...Tem sido muito difícil sem o senhor aqui!
E eu te amo, muito! (Sua Karol.)
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